O funeral

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Havia um silêncio naquela câmera. Era um lugar espaçoso, um teto não muito alto, arrendondado.

Alguns haviam dito algumas coisas, de maneira formal, mecânica quase gélida. Já alguns até usaram de emoção em suas palavras, de forma quase febril, uma alucinação controlada.

Ela estava lá, quieta e bela, mesmo machucada. Tão jovem, tão cheia de futuro, tão agora apagada. Ela teve pouco tempo, alguns diriam, ela fora superestimada, argumentariam alguns.

Não se poderia dizer que ela desistira. Isso não. Lutara e teve recursos para continuar viva, em busca de seus sonhos de liberdade, de vitórias, de alegrias. Mas a doença, o mofo, o velho ainda fora mais forte do que tudo isso. Ser jovem pode assustar.

Alguns choravam calados, porque se sentir impotente frente a fatos imutáveis dói silenciosamente. Haviam aqueles que até se aproximavam da caixa fúnebre e lhe acariciavam a face lamentando a perda tão cara, tão grandiosa.

“Ela faria 27 anos em novembro, mas não deram tempo..” Alguém soluçou.

Fecharam o caixão de maneira rápida, nem se permitiram uma última olhada. Muitos pareciam Temer que ela acordasse depois do golpe fatal que levara. Bobagem, ela não se ergueria dali, estava morta no fim.

Carregaram respeitosos aquela caixa fúnebre, seguindo todo o protocolo pedido. Mas fora irresistível segurar um riso torto entre alguns rostos.

“Ela deu trabalho. Ela daria muito trabalho, melhor assim.”

Quando por fim todos iam saindo, um por um, ficando para trás aqueles que realmente se importavam, já se podiam ouvir lá fora uma algazarra, foguetes, palmas, até barulho de espumantes explodindo. O desanimo tomou conta daqueles poucos.

“Não, não abaixemos a cabeça. Por honra dela é que devemos continuar. Nosso limite não chegou.”

O salto bateu mais forte no piso de pedra, quando a mulher terminou suas palavras e saiu decidida dali.

“Amanhã será outro dia.” Uma voz grave respondeu.

Os outros os seguiram, eles tinham razão.

 

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