Segundos eternos..

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A garota andava distraída naquela tarde, quase noite. Chegara até ali sem nem mesmo perceber como, afinal, era apenas mais um dia como qualquer outro. Sentou-se no lugar que sempre se acomodava. Abriu o livro e leu aleatoriamente, mas não saberia dizer verdadeiramente o que estava lendo, sua cabeça parecia entorpecida por alguma coisa.

O rapaz chegou centrado como sempre chegava. Tranquilo e concentrado, naquela tarde, quase noite, procurou o lugar indicado para as atividades daquele encontro. Com calma, leu, compreendeu e fez o que tinha que ser feito, sem nem mesmo mover os olhos na direção que não fosse seus afazeres.

Então chegara a hora de partir. Ela fechou seu livro sem muita certeza se tinha rendido algo de útil. Ele estava satisfeito com o que tinha feito. Estufou o peito orgulhoso disso.

Passou um vento impossível que a fez afastar os cabelos que voaram em seus olhos e foi aí que ela o percebeu, no exato momento que ele se alto vangloriava do que tinha feito. Coluna ereta, brilho nos olhos, um quase sorriso, o peito cheio.

O dela murchou imediatamente. O ar faltou um pouco então teve que respirar muito fundo para achar algum oxigênio.  Andara tão distraída o tempo todo, mas agora parecia que tudo nela estava em alerta. O sangue passava tão depressa por suas veias que se sentia quente e vermelha. Ela desejava poder correr dali, mas seus membros a fixaram exatamente onde estava. Frações de segundos eternas.

Na próxima batida do segundo seguinte ele resolveu olhar para o lado, pois um vento impossível passara ali o fazendo arrepiar até a nuca, e foi aí que ele a viu. Os cabelos voando em desalinho, o rosto levemente corado, o abraço apertado em um livro grosso. Os olhos perdidos, mas brilhando. Frações de segundo que um olhou fundo na alma do outro.

O vento se fora tão impossível como viera. Ela abaixou o rosto na desculpa de buscar algo que deixara na cadeira, ele negara com a cabeça o que tinha sentido, seja aquilo o que fosse. Mas ainda não havia terminado. 

Aquele encontro de estudos sempre terminava com um dos seus componentes falando sobre o que aprendera com as atividades vividas ali e se davam as mãos como despedida. 

Nenhum dos dois fora capaz de ouvir uma única palavra do outro colega. Ela chegara ao nível máximo de leveza e torpor quando sua mão encostou na dele. Não era capaz de ouvir, ver, sentir mais nada que não fosse a sensação da sua pequena mão sendo enlaçada por uma outra tão firme. Ele não conseguia deixar de sentir a quentura daquela delicada mão, o perfume que parecia ter invadido seus pulmões e a sensação de completude. 

Mas aquele minuto acabara, mesmo que ele fosse eterno. Se soltaram sem nem se olharem uma única vez. Ela abraçada ao seu livro, ele com a mochila lhe pesar os ombros. Nenhum dos dois pudera sequer ouvir o som da voz um de outro.

                              maos

Sete dias, foram sete dias lembrando dos segundos mais intensos que viveram. Sete dias tentando esquecer. Sete dias pensando em como seria agora? Sete dias de um não lembrar, pois jamais se esquecia. 

E o novo dia de encontro chegara. Ela tentara ser natural, como nunca mais poderia. Ele parecia busca-la, mesmo que disfarçadamente. Mas não ficaram mais perto um do outro. E no final não puderam mais dar as mãos, ter aquela sensação de segundos eternizada em suas peles.

E assim foram todos os outros encontros, durante semanas, meses.. anos. O vento impossível nunca mais os tocara, mas os olhares ainda se perdiam, o perfume ainda era marcante, o quase sorriso ainda era tão presente. Ouviram a voz um do outro, inevitavelmente, e a melodia era linda.

Então a vida seguiu. Ela casou, foi feliz e teve sua família, distraidamente. Ele seguiu, focado, tranquilo e orgulhoso de conquistar o que conquistava.

Tudo foi passando, menos aquilo, seja aquilo o que fosse. Nenhum dos dois fora capaz de lembrar mais um do outro, pois lembrar é ter esquecido em algum momento, e isso jamais acontecera com eles.

 

 

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